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terça-feira, 28 de junho de 2011

A descoberta da beira do rio

Conhecida como uma das maiores cidades de Santa Catarina, é difícil imaginar que Blumenau tenha alguma semelhança com municípios do interior. Alguns moradores contrariam esse pensamento quando pescam às margens do rio Itajaí-Açu, no Centro. (Veja os depoimentos)


Segundo Daniel Cardoso Mafra, fiscal do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em Itajaí, quem usa mais de um anzol precisa de licença de pescador amador. Mafra cita ainda que só profissionais podem pescar com rede em rios. Se precisarem, maiores de 65 anos e aposentados não pagam pela licença permanente, mas devem apresentar os documentos para comprovar. Mais informações no site do Ministério da Pesca e Aquicultura.

Já houve campeonato em Blumenau

Sueli Petry, historiadora e diretora do Arquivo Histórico de Blumenau, afirma que a pesca no Rio Itajaí-Açú é uma tradição antiga. Durante a década de 1960, uma loja chegou a promover campeonatos. A historiadora aponta as seguidas enchentes como uma das causas da diminuição dos peixes no rio. (Clique na barra abaixo para ouvir a entrevista)





Em primeiro plano, os jurados na Prainha.
Terminada a competição, todos iam comer peixe.
(Arquivo Histórico de Blumenau)

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Embora haja lançamento de esgoto sem tratamento no Rio Itajaí-Açú, a maioria dos pescadores do Centro de Blumenau come os peixes. Os entrevistados acreditam que evitam problemas de saúde durante o preparo do pescado. Para especialista, a segurança do consumo depende das condições do rio.

Celso Burgel é um dos que não vê problema em comer peixes do rio, mesmo sabendo que o esgoto é despejado na água. “O rio não vai pra a praia e todo mundo não vai tomar banho lá?”

Celso come peixes do Rio Itajaí-Açú. Não faria
isso se soubesse da relação
entre o peso e a poluição.
(Reprodução/Kunimund Krönke Junior)
Segundo Pedro Wilson Bertelli, especialista em Produção e Propagação de Peixes e professor da Universidade Regional de Blumenau (Furb), o risco de uma pessoa ter problemas de saúde ao consumir peixes que vivem no Rio Itajaí-Açú é pequeno. Todas as espécies possuem estruturas de defesa no organismo, mas há um limite de tolerância à poluição, que pode ser ultrapassado, dependendo da concentração de substâncias tóxicas na água.

A quantidade varia de acordo com o volume do rio. Durante as entrevistas, o nível estava baixo. Nesse caso, não é aconselhado consumir os peixes porque há maior concentração de poluentes. Com os índices dentro do tolerável, o organismo dos peixes consegue absorver as substâncias tóxicas.

De acordo com o professor Bertelli, a maioria das espécies do Rio Itajaí-Açú vive, no máximo, três anos. Nesse tempo, o peixe não acumula tantos poluentes no organismo, o que não representa ameaça à saúde. Se soubesse disso, Celso Burgel teria ficado preocupado. Ele contou que já pescou uma Carpa Capim de 15 kg, que, segundo o professor Bertelli, teria entre oito e dez anos.

Mais limpo, apesar do esgoto

Segundo o gerente de controle de poluição da Fundação Municipal do Meio Ambiente de Blumenau (Faema), Tiago Krabbe, o nível de poluição do Rio Itajaí-Açú é considerado bom, dentro da classificação do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Comparando medições nos bairros Passo Manso e Vorstadt, Krabbe afirma que a qualidade da água melhora no percurso pelo aumento de oxigênio dissolvido. Já nos ribeirões Garcia e da Velha a concentração de poluentes é proporcionalmente maior que no leito do Rio Itajaí-Açú.

Para o professor Pedro Wilson Bertelli, a poluição industrial ainda “é forte”, mas tem diminuído por força da lei e dos órgãos de fiscalização. Bertelli também cita o esgoto doméstico como fonte poluidora, já que atualmente apenas 6% é tratado. Segundo a assessoria de comunicação, a empresa concessionária planeja ampliar o tratamento para 60% em 2012.

Atenção para não contaminar a carne do peixe

Temperar o peixe com vinagre, sal ou limão
não é certeza do fim de substâncias tóxicas e parasitas.
(blog Canário & Cia./sxc.hu)
Apenas um dos pescadores disse que não consome o que pesca. Os outros fazem algo durante o preparo que possa reduzir a chance de intoxicação. Celso Burgel tempera com vinagre e limão “porque desinfeta”. Deógenes Angonese, que só leva peixes grandes para comer, e Enio Brandl limpam e deixam o pescado de molho no vinagre. Deógenes diz que lava o peixe em água corrente também.

“O perigo não está tanto no rio, mas na hora que vai limpar”, afirma Pedro Wilson Bertelli, especialista em Produção e Propagação de Peixes e professor da Universidade Regional de Blumenau (Furb). Durante a limpeza do pescado, deve haver cuidado para não misturar a carne ao fígado, por exemplo, onde ficam armazenados metais pesados. Limpar o peixe também tira parasitas.

Embora afirme que receitas caseiras não têm comprovação científica e por isso não existe certeza que temperar com limão, vinagre ou sal elimine substâncias tóxicas e parasitas, Bertelli explica o processo. Colocar sal, por exemplo, causa desidratação, podendo matar esses organismos porque dependem de água. Por esse motivo, os parasitas externos morrem junto quando se tira o peixe do rio. O professor também alerta que lavar o pescado apenas com água corrente não é suficiente.

Pesquisa do laboratório de Biologia Animal da Furb revelou que a maioria dos entrevistados frita o peixe pescado no Rio Itajaí-Açú. Mas, já antes de chegar à cozinha, a diferença de temperatura impede que esses organismos sobrevivam dentro do corpo humano.


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Espécies exóticas são 90% da fauna do Rio Itajaí-Açú
em Blumenau. De cima para baixo: carpa de cabeça grande,
tilápia, carpa comum, bagre africano (à direita) e carpa capim.
(Arte/Jaime Batista/Organização das Nações Unidas para Agricultura
e Alimentação/Anuário Escandinavo de Peixes/Revista Geológica
dos EUA/Robbie N. Cada/Ministério de Pecuária,
Agricultura e Pesca do Uruguai)

A maior parte dos peixes no Rio Itajaí-Açú em Blumenau veio de outros países. Espécies como tilápia, bagre africano e carpa chegam a partir de lagoas comerciais ou são simplesmente liberadas no rio. A pesca pode ajudar a, pelo menos, manter a proporção.

De acordo com o professor Pedro Wilson Bertelli, especialista em Produção e Propagação de Peixes, 90% dos peixes catalogados pela Universidade Regional de Blumenau (Furb), e que habitam o trecho do rio que corta a cidade, são exóticos. A maioria dos pescadores, com quem a reportagem conversou no Centro de Blumenau, citou a carpa comum (Ásia e Europa), a tilápia (África), a carpa capim (Ásia), o bagre africano (África e Ásia) e a carpa de cabeça grande (Ásia e Europa).

Deógenes Angonese, um dos pescadores do Centro, conta que lagoas de pesque-pague transbordaram durante tragédia de novembro de 2008 e muitos peixes caíram nos ribeirões, chegando depois a Rio Itajaí-Açú. O professor Bertelli completa informando que o mesmo pode ter acontecido nas enchentes de 1983 e 1984.

Entretanto, os peixes não migram sozinhos. Quando criadores recolhem os alevinos (filhotes) para comercialização, alguns caem por entre as linhas e outros a rede não alcança. Então, as comportas da lagoa são abertas e os peixes liberados no rio.

Bertelli revela que até o poder público colabora com a introdução de novas espécies. O professor acredita que, por desinformação, a prefeitura empresta veículos para que seja feito o repovoamento de rios e barragens com espécies exóticas, o que é proibido. De acordo com a historiadora Sueli Petry, houve uma tentativa de povoar o rio com espécies nativas nos anos 1950. Coincidentemente, todas as carpas, a tilápia e o bagre africano fazem parte da fauna do rio há mais de 50 anos, segundo Bertelli.

Essa entrada de espécies exóticas no Rio Itajaí-Açú pode ameaçar as espécies nativas. Segundo o professor Bertelli, peixes nativos e exóticos podem ter hábitos semelhantes e competir por alimento. Então, só a espécie mais forte vai sobreviver.

Para mais informações sobre peixes, acesse o site FishBase (em inglês)

Pesca esportiva

Rodrigo Valcanaia é um dos poucos pescadores entrevistados que pratica a pesca esportiva – ou seja, fisga o peixe, bate foto e depois solta. Para o professor Pedro Wilson Bertelli, especialista em Produção e Propagação de Peixes, devolver o peixe ao rio não contribui para a preservação de espécies nativas.

Pesquisa da Universidade Regional de Blumenau (Furb), em fase de conclusão, aponta que os peixes maiores são os mais capturados no Rio Itajaí-Açú. Eles são os reprodutores e favoritos dos pescadores. Segundo Bertelli, “seria bom para o ecossistema”, se apenas as espécies exóticas fossem capturadas.

Comparando a lista de espécies catalogadas pela Furb com a relação de animais aquáticos ameaçados de extinção do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), não é possível afirmar que existam peixes em perigo no Rio Itajaí-Açú porque os pesquisadores da Furb ainda não identificaram detalhadamente algumas espécies.


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