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quarta-feira, 1 de junho de 2011

Fotos em nome da solidariedade

Ponte destruída na tragédia de 2008
no bairro Progresso, em Blumenau. (Jaime Batista da Silva)

“Eu estava em casa escutando o rádio e vi que estava acontecendo algo horrível na cidade e principalmente no meu bairro. Notei que estava na frente das notícias e os órgãos de imprensa precisavam das informações. Então decidi pegar minha máquina fotográfica e minha bicicleta, pois não podia sair de carro. Estava tudo parado por causa da enchente. Então, fui na chuva mesmo com a máquina embaixo da camisa para não molhar.”

Embora pareça uma atitude de um jornalista fora do horário de trabalho, as linhas acima descrevem a atitude de um cidadão comum que leva a divulgação de informações tão a sério quanto qualquer profissional. “Eu pensava que poderia não voltar, mas eu pensei: ‘Não. Eu tenho informação. As pessoas precisam fazer isso, por que se pode conseguir donativos.’ Me senti muito triste, mas também útil e muito orgulhoso pelo serviço que eu estava fazendo, pois com isto Blumenau conseguiu muita ajuda do povo brasileiro.”

E assim Jaime Batista da Silva, bancário, começou a colaborar com fotos para jornais da região e textos para espaços como vc repórter e VC no G1. “Vi a necessidade de informar os outros de algo que não havia nenhum jornalista na área naquele momento.”

Aqueles dias com notícias constantes sobre a cheia dos rios e quedas de encostas para os moradores do Vale do Itajaí e outras regiões de Santa Catarina não foram a primeira oportunidade que Jaime teve para ser um “repórter fotográfico voluntário”, como ele mesmo se define. Em 2008, antes da tragédia, embora em menor quantidade, ele já tirava fotos e enviava material para jornais de Blumenau e Gaspar, onde trabalhava. “Simplesmente eu enviava as fotos para ajudar os jornais e também para me sentir útil e orgulhoso pela sugestão [material] enviada.”

Sucesso na capa dos jornais e na tela do computador

Jaime estima que tenha mais de 300 publicações no canal vc repórter do portal Terra. Assim, o repórter voluntário de Blumenau se tornou o segundo maior colaborador, atrás apenas de um carioca, merecendo destaque do próprio serviço em 2009. Jaime revela preferência pelo site porque “sei que no vc repórter tem profissionais de jornalismo que irão ligar e se inteirar sobre o assunto que eu sugeri para a reportagem” Ele reclama do VC no G1, das Organizações Globo, porque a equipe do site não entra em contato para confirmar as informações. Por isso, Jaime decidiu não continuar colaborando com o G1, parando em aproximadamente 50 publicações.

Fora da internet, a participação do bancário aparece em jornais de Blumenau. Jaime conta, orgulhoso, que o Jornal de Santa Catarina publicou mais de 50 fotos suas, sendo três na capa. No ‘Santa’, Jaime também participou do Conselho do Leitor, que analisa voluntariamente o conteúdo do jornal impresso e internet. “Este serviço eu gostei muito, pois conheci pela primeira vez um jornal e como ele é feito. Tudo isto me motiva a optar por esta paixão que tenho pelo jornalismo.”

O jornal Folha de Blumenau também usa fotos de Jaime. Segundo o repórter voluntário, nem precisa que ele envie, “eles [profissionais da Folha] mesmos pegam no meu blog para publicar no jornal e no site deles”. O material produzido por Jaime também ilustra sites de rádios de Blumenau e outros blogs.

Porém, os jornais não aproveitam todas as fotos enviadas por Jaime. Foi por isso que em maio de 2009, seis meses após a tragédia que aumentou a vontade de colaborar com a cobertura jornalística, Jaime criou seu blog. Desde então são mais de 600 mil acessos, dos quais cerca de 2 mil todo dia. “O meu blog hoje é referência para as pessoas e também para os jornalistas de Blumenau”, afirma Jaime.

“Em qualquer site de busca que você digitar sobre notícias de Blumenau, vai aparecer algo relacionado ao Blog do Jaime. Isto me deixa feliz, pois estou deixando a minha marca na história de Blumenau e sei que isto será útil para as pessoas hoje e para o futuro.” São mais 4.400 publicações, segundo o repórter voluntário. Ele admite que não conhecia blogs antes catástrofe climática de 2008, nem tinha interesse.

Siga o exemplo

De acordo com Béio Cardoso, professor de Jornalismo Digital no Instituto Blumenauense de Ensino Superior (Ibes), compartilhar informações interessantes motiva as pessoas a fazer o mesmo, ainda mais em casos de número de acessos expressivo, como Jaime Batista.

Espelhar-se em alguém faz parte de tentativa de se destacar, segundo Béio. “Na real, todo mundo busca uma certa notoriedade, um reconhecimento pelo seu trabalho. A gente fala os 15 minutos de fama na TV, os números de acesso na internet, visualizações no YouTube e assim por diante.”

O professor do Ibes afirma que se deve postar regularmente em seu blog e comentar em outros para conquistar leitores. “Se eu não faço isso, não sou visto, não sou lembrado. Dependendo do assunto, a pessoa se sente motivada a comentar, participar...”

Exposição

As fotos de Jaime ficam expostas na Câmara de Vereadores de Blumenau (anexo ao prédio da Prefeitura) até esta sexta-feira (3). A partir de segunda (6), o público poderá conferir o trabalho do repórter voluntário no Instituto Blumenauense de Ensino Superior – Ibes (Rua Pandiá Calógeras, 272), como parte do 4º Festival Interdisciplinar de Comunicação (ICOM).


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A credibilidade das notícias na internet

Da esquerda para direita: Cristiane Soethe, Moacir Pereira,
Evandro de Assis e Alexandre Gonçalves. Evento discutiu a função
dos jornalistas com a popularização da internet. (Divulgação/Assimvi)
Durante a tragédia de novembro de 2008, o bancário Jaime Batista da Silva fez parte dos milhares de catarinenses que usaram a internet para trocar informações enquanto os veículos de comunicação enfrentavam problemas técnicos.

Segundo o professor de Jornalismo Digital no Instituto Blumenauense de Ensino Superior (Ibes), Béio Cardoso, foi justamente no ano da catástrofe climática que as mídias sociais ‘estouraram’ e o compartilhamento de conteúdo na internet aumentou, seja com a publicação de fotos em sites de relacionamento (como Orkut) ou a informação via Twitter de quem tinha sido resgatado. “Aí, na minha opinião, Blumenau começou a se ligar que o Twitter era um coisa importante.”  

Para debater a função do jornalista com a popularização das mídias sociais, a Associação de Imprensa do Médio Vale do Itajaí (Assimvi), organizou um evento em maio deste ano no Instituto Blumenauense de Ensino Superior (Ibes). Cerca de 150 profissionais e estudantes de comunicação participaram do encontro com o Moacir Pereira (comentarista de política do Grupo RBS), Evandro de Assis (editor-executivo do Jornal de Santa Catarina) e Alexandre Gonçalves (editor de conteúdo).

A conclusão a que se chegou ao final do debate foi que, apesar da infinidade de pessoas que publica algo na internet (chamadas de “informantes” e “transmissores de notícias” durante o evento), não há garantia sobre a qualidade da informação divulgada. Por isso, jornalistas continuam importantes porque a credibilidade de seu trabalho vem da pesquisa e do compromisso ético em ouvir todas as partes envolvidas.

De hobby a responsabilidade jornalística

Embora não seja repórter profissional, Jaime se preocupa com garantir a credibilidade do que publica. “O que eu gosto de passar para os internautas do blog é a verdade do que eu vejo, sem sensacionalismo. Sou uma pessoa humilde e muito responsável e sei que estou levando o meu nome a público e tenho que ser responsável pelos meus atos. Faço um serviço que era apenas penas um hobby e que virou uma responsabilidade jornalística.”

No caso de reclamações da comunidade, como um buraco de rua, Jaime coloca no blog fotos de antes e depois que o problema é resolvido. Além disso, toma o cuidado de enviar o telefone de contato de pessoas responsáveis.

“A credibilidade que eu passo é que eu não tenho vínculo com política, empresas, imprensa, religião e outros. Sou independente e devo respeito aos meus internautas que acessam o blog e esperam de mim uma informação séria e com credibilidade. Eu vou nos eventos de livre e espontânea vontade com o intuito de buscar a notícia e nunca cobrei de ninguém este serviço.”

Para Béio Cardoso, o leitor do blog pode comprovar a qualidade da informação. “Se várias pessoas comentam que uma coisa está errada, aquilo perde a credibilidade. Então, as próprias pessoas que acessam o blog dele [Jaime], são as que vão fazer a supervisão do conteúdo.”


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Embora ofereça espaços para anunciar em seu blog, Jaime Batista da Silva repete que seu trabalho é voluntário e afirma que sua fonte de renda vem da atividade bancária. “Corro atrás das notícias, procuro me informar, faço as fotos, edito as fotos, converso com as pessoas. Tudo isto gratuitamente sem cobrar nada para publicar a notícia ou enviar as sugestões para os sites de notícias.”

Em sua defesa, Jaime explica que na verdade as empresas o procuraram aproveitando a vitrine para divulgar marcas que pode ser um site de 2 mil acessos diários. “Com este apoio que recebo do anúncio no blog eu faço a manutenção na minha máquina fotográfica e pago os custos que tenho com o combustível para correr atrás das notícias.”

Jaime carrega sua máquina para todo lado.
Repórter voluntário, leva a atividade a sério
mesmo assim. 
(Jaime Batista da Silva)
O tempo separa hobby do profissionalismo

Jaime trabalha em um banco e atualiza o blog pela manhã, antes de sair de casa, durante a hora do almoço e quando volta no final do expediente. “Nos finais de semana é a hora que mais me empolgo para atualizar o blog e correr atrás de notícias.”, diz o repórter voluntário. “Não consigo ficar sem saber as notícias e principalmente sem informar as pessoas que acessam o meu blog diariamente para saber as notícias da cidade.”

Por causa da tragédia de novembro de 2008, Jaime leva sua câmera fotográfica para todo lugar. “Isso aqui vai mostrar o que eu estou vendo e vou poder mostrar pro povo o que eu vi e pode ser notícia.” Além da imagem, o bancário publica informações de releases. “Eu mando uma sugestão, não vou fazer o texto, não dou a minha opinião. Só dou o fato.”

Mesmo não sendo jornalista profissional, Jaime afirma que leva o trabalho a sério. “Sou apaixonado pelo jornalismo e me dedico muito para fazer um bom trabalho. Posso te garantir que passou de um hobby para uma grande responsabilidade.”

O bancário quer transformar o blog em site, sem parar de trabalhar no banco, e pensa em outras mudanças. “Quem sabe eu faça um curso de jornalismo para me aperfeiçoar na área, mas por enquanto estou com meu tempo limitado e lotado.”
Federação Nacional dos Jornalistas
luta pela obrigatoriedade do diploma. (Divulgação)

A liberdade dada pelo STF

O Supremo Tribunal Federal julgou que não é obrigatório terminar o curso de Jornalismo para exercer a profissão. Mesmo beneficiado pela decisão, Jaime, formado em Ciências Contábeis, não concorda. “Para mim o jornalista tem que ter formação sim. Quando envio sugestão para o site do Terra ou para o Jornal de Santa Catarina eu fico mais tranquilo pois sei que um jornalista profissional irá verificar e irá dar todo o suporte que precisa para colocar no ar a publicação que sugeri.”

Para Aristeu Formiga, membro da diretoria do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Santa Catarina, a decisão do STF “liberou geral”. No caso dos blogs, Formiga lembra que não é algo exclusivo de jornalistas. “Cabe ao leitor do blog escolher a informação que lhe pareça crível.”


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Página do vc repórter. Por aqui o cidadão comum pode enviar seu registro.
(Reprodução/vc repórter/Portal Terra)
"Hoje eu posso dizer que o jornalismo cidadão faz parte da minha vida e que eu fico muito feliz quando uma sugestão minha ou uma foto que enviei vira notícia através de profissionais qualificados de jornais e sites de notícias”, diz o bancário Jaime Batista da Silva, segundo maior colaborador do canal vc repórter do portal Terra.

De maneira resumida, chama-se jornalismo cidadão, colaborativo ou participativo a divulgação de informações na internet por pessoas comuns que testemunham fatos. Elas batem fotos, fazem vídeos e/ou escrevem textos sobre acontecimentos que jornais, revistas, emissoras de rádio e TV não cobrem.

Então, o material é geralmente enviado para espaços oferecidos em portais, como vc repórter e VC no G1 – em que o conteúdo passa pela avaliação de jornalistas profissionais – ou publicado em blogs. Esse tipo de participação do público aumentou com a popularização de câmeras de digitais – fotográficas, principalmente – e facilidade de acesso à internet.

“Os profissionais precisam da ajuda da comunidade para interagir e ter informações sobre o que está acontecendo nas cidades e onde muitas vezes um jornalista não está presente”, afirma Jaime, que mandava fotos para jornais da região de Blumenau e intensificou o trabalho depois da tragédia de 2008.

Há muitas dúvidas em relação à credibilidade e a qualidade do material enviado porque não é produzido por jornalistas profissionais, que teoricamente tem mais cuidado na apuração das informações. Mesmo assim, emissoras de TV atualmente pedem que os telespectadores enviem fotos e vídeos, também disponibilizando o contato da produção e outros meios de interação ao vivo entre apresentador e público.

Além dessas formas mais comuns de participação, Béio Cardoso, professor de Jornalismo Digital do Instituto Blumenauense de Ensino Superior (Ibes), cita que alguns jornalistas antecipam o assunto das pautas pelas redes sociais. Assim, o público pode colaborar sugerindo fontes e até com material. “Eu não pego mais um conteúdo, guardo às sete chaves e depois mostro. Muito pelo contrário. Eu pego a bandeira: ‘Vou falar sobre isso... Me ajudem!’”

Assim, como os cidadãos que registram os fatos, o professor do Ibes fala que os jornalistas devem aproveitar as oportunidades quando têm câmeras digitais, conexões de internet móvel, entre outras facilidades tecnológicas à disposição no momento. “Se tem um acidente e a pessoa é médica, a pessoa vai ali e ajuda o acidentado. Se você é jornalista e aconteceu um fato, você tem que documentar. Um profissional da área de jornalismo tem que entender que isso tá no DNA dele.”

Exposição

As fotos de Jaime ficam expostas na Câmara de Vereadores de Blumenau (anexo ao prédio da Prefeitura) até esta sexta-feira (3). A partir de segunda (6), o público poderá conferir o trabalho do repórter voluntário no Instituto Blumenauense de Ensino Superior – Ibes (Rua Pandiá Calógeras, 272), como parte do 4º Festival Interdisciplinar de Comunicação (ICOM).


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